quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

A Igreja troca de enfoque
Achylle Alexio Rubin /achyllerubin@yahoo.com.br
Blog: achyllerubin.blogspot.com

Talvez seja muito interessante para os cristãos do Brasil e da América Latina tomarem consciência que a compreensão da vida cristã e da evangelização está mudando de enfoque. Está voltando a centrar-se numa perspectiva aguardada por muitos.
De uns quarenta anos para cá se tem sistematicamente doutrinado o povo cristão para crer que o objetivo da evangelização seria a “ação social”. Falava-se, sem mais nem menos, como se a missão da Igreja fosse a “transformação da sociedade”, a “mudança das estruturas sociais”. Ultimamente ainda escutei de bispos de grande projeção que “a missão nossa” seria “encontrar caminhos de se promover as famílias... de sair da sua pobreza, da sua miséria...”, “até com políticas públicas que temos de exigir do governo”, sem deixar de afirmar que “também é nossa grande tarefa: conduzir as pessoas a Jesus Cristo”. Um outro escreveu que “a proposta original da Igreja para conseguir a transformação que desejamos para a sociedade...” acontecerá “paralelamente” com “a renovação das pessoas”.
Os advérbios “também” e “paralelamente” traem, na minha percepção, uma séria ambigüidade e implicam, ademais, em perplexidade entre os cristãos. Todos sabemos que, na prática, há movimentos cristãos que se afanam em transformar as estruturas sociais e há outros que se aplicam com empenho na “renovação das pessoas”. Julgo que é chegada a hora de encontrar a boa relação entre ambos os grupos. A intenção existe, mas a concretização está se verificando penosa e lenta.
Registro aqui minha opinião sobre a causa desse desconforto na comunidade cristã. Observe-se por primeiro que o cristianismo, como a própria palavra indica, se refere à pessoa de Cristo. Ele como sua primeira “práxis”, veio nos gerar no amor até o extremo, filhos de Deus Pai.
Nessa fé acontece o que se chama de “vida em Cristo”. Isto é, filhos, participantes da natureza de Deus Pai (2Pd 1,4). Ora, natureza é vida, como acontece em nossa filiação natural. Recebemos a mesma vida de nossos pais. Somos uma repetição deles, até mesmo com os traços fisionômicos. Filhos de Deus e duplamente “imagem e semelhança de Deus” (Gen 1,26), por criação e por redenção.
A tendência de apontar o “social” como objetivo da Igreja, entrou com o paradigma “opção pelos pobres”. Sem delongar-me em explicações, subscrevo uma afirmação de Bento XVI. Disse ele aqui no Brasil: “a opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica”. Isto quer dizer que tal opção deve ter como ponto de origem a “vida em Cristo”. Ela brota, “flui” espontaneamente da mesma vida. Filha da dessa vida, deve ostentar sua “fisionomia”.
Portanto, a “vida em Cristo” e a “ação social” não são duas coisas “paralelas”. Não são heterogêneas, mas homogêneas. Tomemos um desses livros de vidas de santos, como aquele de Dom Servilio Conti, e observemos só como todos os santos e santas na história da Igreja foram grandemente compassivos para com os pobres e doentes, e por eles deram tudo de si, socorrendo-os de inúmeras maneiras sem, contudo, ter feito “opção pelos pobres”. É que, o cuidado pelos pobres, brotava espontaneamente da “vida em Cristo” que neles se ternara adulta.
Há tempo venho me perguntando se a “revolução” social acontecida no Império Romano foi fruto da “ação social” dos cristãos, ou aconteceu por um processo de infiltração do “fermento” da vida cristã nas estruturas sociais do Império.
Encontro boa analogia nas árvores da cidade da Mata e dos arredores de Santa Maria, transformadas em pedra. Quando o Império Romano se deu conta, a mãe do imperador pagão era nada menos do que uma santa cristã, Santa Helena. Cristo havia dito que “o reino dos céus é semelhante ao fermento” que faz levedar toda a massa (Mt 13,33). Não disse que o reino era a massa, mas sim o fermento. Suspeito que muitos, hoje, se ocupam e gastam esforços pessoais e bens materiais com a “massa” das estruturas sociais e descuidam do fermento da “vida em Cristo”, capaz de levedar a “massa”. Felizmente a Igreja no Brasil está trocando o enfoque, da massa para o fermento...

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