domingo, 24 de fevereiro de 2008

Troca a Igreja de enfoque?

Troca a Igreja de enfoque?

Na última crônica tratei da troca de enfoque da Igreja no Brasil. Um jovem estudante de pós-graduação em filosofia manifestou-me o desejo de saber mais. Escreveu-me: “o senhor não explicitou onde vê isso... gostaria de saber sua opinião sobre esse novo fenômeno, animador para todos nós”.
Não há dúvida a troca de enfoque da Igreja é consoladora. Já escrevi a respeito ao encabeçar uma crônica com o título: “a Igreja em correção de rota”.
Vejo que a preocupação dos dois últimos Papas esteve voltada no sentido de reorientar posições teológicas e pastorais de nossa Igreja. Basta recordar que na década de oitenta a Santa Sé nos mandou a respeito dois documentos, chamados de Instruções. Em seqüência João Paulo II escreveu uma “mensagem ao episcopado do Brasil” na qual advertia sobre três condições para uma autêntica teologia católica.
Primeira condição. A Teologia que prevalece no Brasil será “oportuna” e até “necessária” se for “coerente com os ensinamentos do Evangelho, da Tradição viva e do perene Magistério da Igreja” (nº 5).
Segunda condição. Para que a teologia em questão alcance os desejados frutos de libertação, os pastores devem velar incessantemente a fim de que essa teologia se “desenvolva no Brasil e na América Latina, de modo homogêneo e não heterogêneo (sic) com relação à teologia de todos os tempos, em plena fidelidade à doutrina da Igreja...” (nº5).
Terceira condição: “A libertação é, antes de tudo, soteriológica (isto é, um aspecto da Salvação realizada por Jesus Cristo, Filho de Deus) e depois ético-social (ou ético-política)”. Por isso, não se pode reduzir o soteriológico ao social, ou ao político. “Antepor” o ético-social, ou político, ao soteriológico “é subverter e desnaturar a verdadeira libertação cristã” (nº 6).
Mas o fenômeno de troca de enfoque na Igreja aparece mais claramente em dois grandes momentos, a IV e a V Conferências do Episcopado, uma em Santo Domingo (1992) e a outra em Aparecida (2007).
Em ambas houve troca de método teológico. A respeito da IV Conferência um destacado teólogo acusou essa troca e muitos outros o secundaram. Ele lamentou o abandono das “analises da realidade... Com isso (a IV Conferência) se afasta do tradicional método de nossa pastoral: ver-julgar-agir”.
Quanto à V Conferência, muitos teólogos celebram o resgate do método “ver-julgar-agir”. Entretanto, não se dão conta, ou preferem silenciar, que o Documento final de Aparecida, dá a tal método outro sentido. Afirma textualmente que o “ver” significa que “vejamos a realidade à luz da Providência”, o “julgar”, que “julguemos segundo Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida” e o “agir”, que “atuemos a partir da Igreja” (nº19).
Pois bem, a troca de método representa troca de objeto. Método significa caminho para alcançar um objeto. Trocar o “caminho” significa trocar o objeto. No Discurso Inaugural de Aparecida, o Papa disse a respeito uma palavra contundente: “Se não conhecemos a Deus em Cristo e com Cristo, toda a realidade se torna um enigma indecifrável; não há caminho e, não havendo caminho, não há vida nem verdade” (DI 3).
No mesmo Discurso, Bento XVI, proclamou como objetivo da Igreja “a prioridade da fé e da vida em Cristo” e não a transformação das estruturas sociais, assim que “o método com o qual nós agimos na Igreja”, não é a análise da realidade mas, a “escuta da Palavra de Cristo no Espírito Santo”.
Julgo que com essas referências tenho acenado para as razões por que estaria em andamento uma troca de enfoque em nossa Igreja.

3 comentários:

luciano disse...

querido Pe. Achylle, que saudades de ti e de teus ensinamentos, como sempre, de uma grande sabedoria.
a respeito do tema por ti abordado, vejo que a igreja catolica està tomando direcoes na qual procura ''resgatar'', senao que tambem ''salvar'', certos valores que, infelizmente nos dias de hoje, nao os vemos mais com grande frequencia no dia a dia das pessoas.
como è de teu conhecimento, moro na italia ha mais ou menos 7 anos e aqui que è o centro da igreja catolica (digo isso pelo fato de o Vaticano ser aqui), vejo um desinteresse così grande nas pessoas, sobretudo jovens, em relacao à igreja e que, por mais grandes sejam os esforcos da mesma, existe tambem uma grande dificuldade em ''recuperar'' aquele entusiasmo e crença nos fieis. diante disso questiono?: sera que è a igreja catolica que ainda nao encontrou a forma exata de chegar ate os coracoes das pessoas, ou somos nòs (humanos) que estamos nos afastando cada vez mais da palavra de Deus, enchendo esse 'espaço' com outras coisas futeis e, de consequencia, vivemos achando desculpas como falta de tempo etc.?
um grande e forte abraco fraterno e que Deus te abencoe sempre.
do teu amigo e ex noviço, Luciano Sambugaro

Pe. Achylle disse...

Amigo Luciano
Estive um pouco afastado do meu blog e por isso demorei em ler teu comentário à crônica "Troca a Igreja de enfoque?". Mas gostei muito de tua manifestação, junto com preocupação pelo que está acontecendo na Igreja, hoje. O irmão do Leonardo Boff, Frei Clodovis Boff, com quem me comunico há tempo, representa a meu ver uma mudança benéfica, afastando-se muito dos que ainda seguem o método marxista. Os dois últimos Papas estiveram muito preocupados. De fato, uma grande faixa da Igreja Católica se ocupou, tanto da parte da doutrina como da prática, com temas laterais, como seja a transformação social como objetivo imediato da evangelização. E assim estiveram supondo Jesus Cristo e não levando-o em conta. Bento XVI, na abertura da V Conferência da América Latina em Aparecida fez uma pergunta impenhativa: "Nós os bispos acreditamos mesmo que Jesus Cristo é o caminho, a verdade e a vida?". Em seguida ele apelou para que "a fé e a vida em Cristo" seja prioridade de tudo na vida cristã. Bem, querido Ludiano, se vês neste blog os artigos sobre a V Conferência, encontrarás mais coisas. Abraços e bênçãos!
Pe. Achylle

Anônimo disse...

Estimado Luciano, sei exatamente como é a sensação de estarmos num lugar católico mas que não tenha o entusiamos (estar cheio de Deus!) que precisamos. Não conheço a Italia ainda, mas fui na Espanha, na capital... na Catedral e que horrível não poder visitar o Santíssimo pois estava fechado! Mas o "museo" que fica dentro da Igreja (assim era em 2005) estava aberto... uma tristeza.

Espero que a chada da TL seja curada e que as feridas que deixou sejam sanadas por verdadeiros teólogos católicos!

PAX

Julie Maria