terça-feira, 4 de março de 2008

Quando é justo o Direito?

Crônica 40
Quando é justo o direito?

Nestes dias ocupei-me de filosofia do direito. O jurista, Pe. Eugênio Pozzobon, pediu-me um prefácio para seu novo livro sobre os fundamentos do direito. Tentei definir o direito e, sobretudo, apontar as razões que o tornam justo. Quando será justo o direito?
Em resumo, a natureza do direito pertence à categoria da “relação”. Aqui se trata da relação de posse. Vários objetos, graças a um título de posse, são possuídos por alguém. Há uma relação do objeto possuído com o sujeito possuidor, fundamentada pela posse. Os títulos de posse podem ser o da herança, o da apropriação de bens sem dono, o da doação, o da compra, etc. Mas o mais importante de todos os títulos trata-se daquele que diz respeito à posse da própria natureza racional, que somos. Como assim?
Nossa natureza, graças à sua racionalidade, manifesta que somos posse de nós mesmos. A consciência da pessoa dá testemunho de seu ser individual, autônomo, personalidade. Como tal, há em nós uma natural exigência ao reconhecimento e ao respeito. Opomo-nos a toda sorte de invasão à nossa intimidade. É a própria consciência que revela à pessoa humana ser, antes de tudo, possuidora de si mesma, com exigência a ser respeitada por si mesma, como sujeito privilegiado de direito que não permite ser violado por ninguém. Trata-se de um direito primário, fundamental. Os psicanalistas se esforçam por libertar o adulto dos traumas da infância, criados pela falta de respeito por seu direito primário. Foi isso também que orientou a Declaração dos direitos humanos da ONU.
Além do direito individual há o direito social. Este acontece quando várias ou muitas pessoas possuem um bem em comum, o “Bem Comum”. A posse comum de um bem funda a ordem social, uma rede de relações mútuas em vista do mesmo bem. Como o direito individual estabelece relações mútuas, assim o direito social estabelece relações e obrigações sociais.
O positivismo, cujo fundador foi, na época moderna, o filósofo e sociólogo Augusto Comte, não consegue elaborar bem esses direitos fundamentais, pois eles ultrapassam o direito positivo, único reconhecido pelos positivistas. A lei positiva permite muitos absurdos que estão acontecendo. Pela lei positiva todos os ditadores justificaram a violação dos direitos humanos. Temos abundância de exemplos muito próximos.
O fundamento do direito, entretanto, vai mais longe, transcende o direito básico, imediato, fundado na natureza da pessoa. Apóia-se, ainda, sobre o sentido último da vida. O homem, ser racional, busca incansavelmente ser feliz. Está em constante busca daquilo que possa preencher seu desejo de felicidade. Não serão os bens limitados que irão satisfazê-lo. O homem é um ser insaciável. Sua ânsia de posse não tem limites. Isto revela ânsia pela posse do bem maior, do “Sumo Bem”, como o chamou o grande filósofo, Aristóteles.
Em conseqüência, toda posse, todo direito sobre bens limitados, em definitivo, não o saciará nunca, não o fará feliz. Tais bens só encontrarão sentido se orientados, ordenados à consecução do Sumo Bem. Assim que, todo direito passa pela pessoa individua e se orienta, se subordina ao Sumo Bem. Não será com coisas materiais, ou intermédias, que se preencherá o desejo de ser feliz. O desenvolvimento econômico, a longo prazo, não traz felicidade. Não levando em conta a ânsia do Sumo Bem, termina-se atropelando os direitos humanos, o direito à felicidade.
A autoridade que não subordinasse o direito ao Sumo Bem, subordinando a ele todo direito, revela que não entende de humanidade, que não sabe, ou nega a aspiração mais profunda do ser humano. Por mais abundantes que sejam os bens materiais, dissociados, porém, do Sumo Bem, manifestam-se incapazes de realizar a felicidade. Não consta que os mais ricos sejam mais felizes. Muito pelo contrário.
Portanto, só é justo o direito que se oriente por todos os valores humanos desde a fonte imediata da própria natureza, até a fonte última, o Sumo Bem.

6 comentários:

Anônimo disse...

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Muito obrigado por seu comentário. Não sei muito inglês mas entendi que você foi muito amável e apreciou o conteúdo de meu blog. Que Deus o recompense pelo estímulo que me traz. Abraços! Achylle A. Rubin

Arsênio Becker disse...

Pe. Achylle, gostei muito de seu belo texto "Quando é justo o Direito?". Tão enxuto e tão rico de conteúdo básico! Muito oportuno atualmente, quando, bafejado pela esquerda no poder, vem sendo desenvolvido "O Direito Achado na Rua". De acordo com o modleo gramsciano, ele constitui o germe jurídico de eventual regime socialistta.
Receba forte abraço de
Arsênio Becker

João Eichbaum disse...

O conceito de "justiça" é muito relativo e varia de pessoa para pessoa, no tempo e no espaço. Por isso, nem sempre o direito é "justo". É preciso não esquecer que as leis fazem parte do sistema jurídico e esse, por seu turno, faz parte do "direito" como ciência. E como existem leis iníquas, sem falar nas inócuas. Em suma, não existe direito absoluto. Abraços Carvalho

Pe. Achylle disse...

Amigo João Carvalho
É um prazer receber um comentário do amigo. Vou tentar colocar meu ponto de vista. Quando dei aulas de filosofia do direito, ainda na Faculdade do saudoso Irmão Gelásio, eu iniciava as aulas com as perguntas: Qual a razão por que o direito é direito e não torto? Tem sentido falarmos em direito, direito, isto é, justo? Por aí enveredava a questão da justiça. Para julgar se o direito é justo devemos ter um parâmetro justificador. Do contrário o direito ficará à mercê da vontade arbitrária de quem detém o poder e a democracia se torna inviável.E acontecem duas consequência: ou ditadura, ou anarquia. Agora, por exemplo, vejo que no Brasil, a justiça vai mal. A justiça, vejo-a como um ideal necessário, à semelhança da verdade, que devemos estar sempre buscando-a, fazendo constantes correções de rota, por conta de nossas limitações humanas.
Bem, amigo João, com teu grande coração, Deus está inclinado para ti. Os de grande coração são os prediletos. E também a grande Mãe Maria. Abraços e bênçãos em abundância, pois, mereces! Pe.Achylle

Unknown disse...

Rafa
Este tema nos faz refletir e ter a consiencência de que todo cidadão tem o seu direito, porem cada um deve correr atras. No entanto nem sempre a lei que prevalesse é justa.Beijos
Ass: Rafaela