domingo, 16 de dezembro de 2007

Papai Noel versus Natal

Papai Noel versus Natal
Achylle Alexio Rubin / achyllerubin@yahoo.com.br
Blog: achyllerubin.blogspot.com
Muitos lamentam que o Papai Noel faça ir para os ares o verdadeiro sentido do Natal, conhecido por toda pessoa medianamente culta. Vou tentar, entretanto, abrandar essa justa preocupação, apresentando duas considerações.
Em primeiro lugar, é verdade que o que aparece ostensivamente na mídia, na propaganda comercial, nos cartazes de ruas e praças, inclusive no seio das famílias, é o Papai Noel. Dá a impressão de que o sentido máximo do Natal não existe mais.
Entretanto, também me parece ser verdadeiro que, no silêncio das igrejas, dos encontros das comunidades cristãs, do aconchego das famílias, da novena de Natal, verifica-se outra realidade bem mais profunda, bem mais real. Considero que grande parte das pessoas está voltada para o Natal. Vale-se do Papai Noel apenas como expediente de propaganda, ou como alimento da imaginação infantil, mas sempre como coisa absolutamente secundária. Os mitos também influem, por exemplo, no relacionamento familiar. Recordo de pequeno que quando se nos soltava um dente de leite, o guardávamos cuidadosamente numa fresta da casa para gozarmos de manhã da sensação de encontrarmos em seu lugar uma moeda.
A segunda consideração que o Natal me sugere gira em torno do que acabo de afirmar. Os que não deixam a figura do Papai Noel empanar o Natal sabem que, quando se trata do próprio sentido de nossa existência, não podem prevalecer ilusões desse tipo. Explico-me com a máxima clareza possível.
O Papai Noel revela no íntimo do ser humano um desejo de alcançar plenitude. Somos seres insaciáveis. É como uma paixão. Não conseguimos nunca estar satisfeitos com o que temos. Queremos ter sempre mais. Revela-o, sobretudo nesta época, a ânsia com que nos lançamos às compras, à troca de carro por um modelo novo, ou à troca do computador, ou do celular...
Um antigo filósofo, talvez Diógenes, reagindo contra essa “loucura”, olhava para os mercados e exclamava: “Senhor meu Deus, eu vos agradeço porque nada disso eu preciso!”.
Um filósofo contemporâneo, Jean Paul Sartre, inteligentemente reconheceu que nós temos essa paixão pelo infinito dentro de nós, mas, sendo ele ateu, definiu o homem como “uma paixão inútil”. Assim, para ele, nada tem finalização. E não tendo finalização tomba-se no puro sem-sentido, no absurdo de todo existir. O que revela tal fato tão bem caracterizado por esse filósofo?
Revela que, ou somos de fato um absurdo, ou então somos um vazio de Deus que anseia avidamente ser preenchido. Toda vez, porém, que não temos o infinito, o absoluto a encher esse vazio, nós apelamos para sucedâneos. Tentamos, ilusoriamente, encher o vazio de Deus com aquilo que já o grande Aristóteles dizia em sua Ética a Nicômaco: o ignorante, escreveu ele, coloca sua felicidade nos prazeres, nas riquezas e nas honras; o sábio, porém, a coloca no Sumo Bem. Hoje se costuma caracterizar tal ignorância com três verbos: prazer, ter e poder.
O vazio de Deus em nós é, na verdade insuportável. Ou se o preenche com o próprio Deus, ou tentamos preenchê-lo com nossas ilusões. Não seria tão trágico se não estivesse em jogo o próprio sentido de nossa existência. Sem aquele único que poderá encher esse vazio de sentido, cairemos no pessimismo absoluto, conforme a conclusão do filósofo citado: Nada tem sentido, nossa própria existência se esvai no absurdo.
A conclusão a que estou chegando é que as corridas para as compras, as celebrações em torno do Papai Noel, revelam um elemento positivo: o vazio de Deus uivando em nosso interior.

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